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Por que devemos ler Júlia Lopes de Almeida?

Abolicionista, republicana, feminista convicta, Júlia Lopes de Almeida foi a única mulher a ter sido cogitada para participar como membra efetiva da Academia Brasileira de Letras até 1897

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Recentemente, li “A família Medeiros” e fiquei bastante impressionada em como Júlia Lopes de Almeida é tão pouco lida. Ela foi e continua sendo de imensa importância para a literatura brasileira, tendo sido fundamental no cenário entre o século XIX e XX.

Abolicionista, republicana, feminista convicta, foi a única mulher a ter sido cogitada para participar como membra efetiva da Academia Brasileira de Letras, em 1897.

Porém, foi excluída justamente por ser mulher. Em seu lugar, como “prêmio de consolação”, seu marido na época, o poeta Filintino Almeida, ocupou o lugar.

Mas vamos ao livro que tanto gostei: um romance com final surpreendente, temos uma família comandada pelo pai Medeiros, um escravocrata tradicional, pertencente à elite cafeicultora paulista. O enredo é ambientado em Campinas, interior de São Paulo, onde Júlia viveu na infância.

O filho, Otávio, acaba de chegar da Europa, onde se converteu ao abolicionismo e republicanismo.

Júlia manifesta no romance todos os seus ideais antiescravistas, mostrando aqui a decadência lenta e gradual da ordem escravocrata no país.

Após a morte do pai, Eva, sobrinha de Medeiros, se muda para a casa do tio, passando a viver com a família. Através de Eva, Júlia Lopes defende todos os seus ideais progressistas, como a emancipação das mulheres e o fim da escravidão.

Eva funciona como uma espécie de alter ego de Júlia, ao defender o processo de modernização das relações de trabalho, a emancipação feminina e o fim do sistema escravista.

Quando Otávio, recém chegado da Europa e convertido ao abolicionismo e republicanismo se apaixona por ela, temos um interessante e inesperado desfecho.

A história acontece no momento de transição entre o trabalho forçado e trabalho assalariado nas plantações de café paulistas, e é interessante a construção da narrativa que Júlia faz ao mostrar a lenta e gradual decadência da ordem escravocrata no país.

Pode parecer tão distante um livro escrito e publicado nos anos finais do século XIX, que denuncia as condições de vida da população negra no Brasil e ainda “ousa” problematizar a vida imposta às mulheres, mas ao lermos encontramos em suas páginas questões tão atuais que chegam a nos assustar com a similaridade.

Júlia Lopes de Almeida possui uma obra bastante ampla, mas o livro que a escritora ganhou projeção foi justamente esse. Sendo, inclusive, o primeiro que li dela. Falha também minha.

Em uma época em que mulheres escreverem era mal vista por uma parte da sociedade, teve seus primeiros ensaios publicados no jornal “Gazeta de Campinas”. Ali ela defendia temas diversos, como o voto feminino, o reconhecimento do divórcio pelo Estado e até a busca por educação escolar formal e gratuita para meninas de todas as classes sociais.

Além de feminista convicta, as defesas de pautas tão polêmicas em uma época tão reacionária, mostra que Júlia Lopes deve ocupar a posição de uma das mais importantes vozes da história.

Apesar de todos esses feitos e uma obra literária vasta e preciosa, seu nome foi aos poucos sendo apagado da história. E é importante lembrar que ela foi à única mulher cogitada para a Academia Brasileira de Letras.

A importância de conhecermos e lermos mulheres são a de não deixarmos esses nomes serem apagados e esquecidos.

Muitas dessas mulheres escritoras exerceram papel fundamental e ativo nas criações literárias na luta por direitos femininos na época. Dentre eles, podemos destacar alguns nomes:

  • Maria Firmina dos Reis;
  • Josefina Álvares de Azevedo;
  • Ignez Sabino;
  • Nísia Floresta;
  • Anita de Sousa;
  • Emília Freitas.

Dessa forma, é assustador percebemos como o racismo e sexismo formam a base estrutural da sociedade brasileira, sendo por ela mesma beneficiado.

Por isso, é sempre bom lembrar como boas obras literárias nos servem como espelhos e lembretes sociais. E como essa obra , e Júlia, não poderiam ter sido relegadas ao esquecimento.

Outro bom motivo a ler esse livro, é essa edição caprichosa da editora Carambaia.

A Carambaia é uma editora que possui em seu catálogo obras primorosas, bem feitas e títulos bem selecionados, mas, além disso, ela tem como proposta também a valorização dos tradutores. E diferente de outras editoras, coloca sempre em destaque na capa do livro o nome desses junto ao autor da obra traduzida.

No caso dessa edição, a editora colocou o nome de Júlia com o mesmo tamanho que o título do livro, em uma bela resposta simbólica ao apagamento de uma das maiores e mais importantes personalidades brasileiras. Outro destaque é o projeto ter realçado a cor roxa, simbolizando o compromisso da autora com as questões feministas.

Outro detalhe no projeto gráfico que merece atenção é a capa ser representado pela flor camélia. A camélia, no final do século XIX, tinha uma função secreta: quem a usasse na lapela, no vestido ou mesmo a plantasse nos jardins em frente à sua casa, era identificado como apoiador do abolicionismo.

Assim, a camélia era uma espécie de comunicação secreta entre os que apoiavam o fim da escravidão.

E aí, temos motivos mais que suficientes para lermos e falarmos mais sobre Júlia, não é mesmo?

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