Como foram os debates do Jornal Opção, da perspectiva dos bastidores
Nesta semana, o Jornal Opção realizou grandes debates entre os candidatos a prefeito das três maiores cidades de Goiás — Anápolis, Aparecida de Goiânia e Goiânia. Vale aproveitar a experiência para refletir, a partir da perspectiva de quem esteve envolvido nos bastidores, sobre o estado da democracia no país, o jornalismo como fórum de debate público, e a comunicação política.
Primeiro, é preciso contexto. O formato do gênero jornalístico debate evoluiu dos primeiros debates televisionados, que, no Brasil, datam de 1982, e que vieram da prática americana surgida em 1960. Daquelas primeiras mesas-redondas, permanecem as características centrais: a figura do mediador, o tratamento igualitário aos concorrentes, o discurso voltado para o eleitor indeciso, a temática pré-definida e declarada.
Desde então, quase todo o resto mudou. Inicialmente, jornalistas pensavam na conversa entre candidatos a partir de seus papéis, ou seja, como quem faz reportagem. A reportagem é um gênero que presume concatenar a caótica realidade em um discurso coerente; por isso, a disputa entre os adversários era muito mais guiada pelo mediador sua produção. Perguntas dos jornalistas ocupavam mais tempo de transmissão, direitos de resposta não eram regra e, em algumas ocasiões, o mediador intervinha para “restaurar a verdade dos fatos”.
Com o passar dos anos, entretanto, candidatos compreenderam que podiam reivindicar mais poder sobre os rumos da conversa com a ameaça de se ausentar dos debates. Gradualmente, o foco migrou do conteúdo das falas para sua forma. Logo, marqueteiros compreenderam que imprimir uma aparência jovem ou de trabalhador do povo podia determinar os rumos da eleição. Em 1960, o jovem americano John F. Kennedy contrastou com a aparência cansada de Richard Nixon, da mesma forma como o enérgico Trump tirou proveito eleitoral da idade avançada de Joe Biden neste 2024.
Este movimento foi levado ao extremo com as redes sociais. Debates são longos e a atenção das pessoas está curta. Pablo Marçal (PRTB), atualmente candidato em São Paulo, não vai a debates para vencer seus oponentes, ele os frequenta para produzir conteúdo. Os cortes para Instagram viralizam e a maior parte do público tem acesso apenas aos momentos triunfantes de seu candidato. Marçal já tem um imitador em Goiânia, que, no púlpito, falou sobre postagens no Instagram, como se a função dos debates fosse gerar conteúdo para seguidores virtuais, ignorando adversários fisicamente presentes.
Hoje, sob pena de processos, a produção dos debates fica sob cuidadosa responsabilidade dos veículos de comunicação, que precisam oferecer condições de igualdade a todos os candidatos, mas o sucesso ou fracasso das transmissões depende das imprevisíveis estratégias dos próprios candidatos. É uma aposta: por um lado, o público entende que os veículos fornecem holofotes e microfone para que os candidatos digam o que querem, portanto, sentem-se agredidos quando o candidato opta por uma tática ofensiva. Por outro lado, é na forma e não no conteúdo que o candidato que escolhe essa estratégia está pensando — ele quer que os eleitores o vejam como alguém incisivo, disposto a lutar contra qualquer um por seus ideais.
É do jogo. Pelo retorno que o Jornal Opção recebeu após os debates, percebemos que, às vezes, a estratégia funciona. Segundo a avaliação do radialista Jairo Mendes, da 105,7FM de Anápolis, Márcio Corrêa (PL) se saiu bem por ter sido “fustigado” e conseguido boas respostas. “As perguntas mais ácidas foram dirigidas a ele, principalmente pela candidata Erizania (UB), e ele conseguiu se sair bem”, avaliou.
Márcio Corrêa fez falas duras, mas, para o público, havia sensação de “fogo trocado”, pois ele também recebeu perguntas duras. Neste debate, Antônio Gomide (PT) exibiu postura tranquila, mas, para Jairo Mendes, “Ficou claro que Gomide tentou se proteger enquanto Erizania e Márcio ficavam no embate entre si. Ele teve atitudes mais pacíficas, quase como um observador.” Esta é uma leitura possível, em especial para o público de uma cidade como Anápolis, altamente politizada e polarizada, onde campanhas carregam nas cores ideológicas.
O contexto é diferente em Goiânia, entretanto. Segundo levantamento do Opção Pesquisas, 31,6% dos entrevistados consideram a administração municipal péssima (pesquisa de número GO-05502/2024). Isso significa que eleitores sentem que a Capital tem problemas reais — coleta de lixo, saúde, probidade. Quando um candidato escolhe atacar adversários que não revidam em detrimento de apresentar propostas para problemas concretos e cotidianos, a mensagem pode soar como desinteresse pela missão de cuidar da cidade, e interesse excessivo em marketing eleitoral.
Do ponto de vista da produção do debate, os jornalistas em parte se sentem aliviados do encargo de guiar as conversas, mas há o ônus de sentir que foram tragados para dentro dele. No primeiro debate entre presidenciáveis, realizado pela Band em 2022, o candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) fez ataques à jornalista Vera Magalhães. O presidente disse que Vera era uma “vergonha para o jornalismo” e que achava que a jornalista dormia “pensando” nele. Vera Magalhães não era candidata, mas não interessava — novamente, era a forma anti-imprensa que interessava, e não o conteúdo. Semelhantemente, Fred Rodrigues (PL), no Opção Debate 2024 de Goiânia, acusou os membros da assessoria jurídica de serem tendenciosos por não lhe concederem direitos de resposta. É do jogo, e os candidatos conhecem seus eleitorados.
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